quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Navega-dor do desejo


Menina, 
tira o mundo das costas
carrega só o que vale a pena
que a pena às vezes já pesa demais


Mulher, 
tira a raiva do buraco
pari essa sua dor
vira conta-dor do corpo
vive-dor da alma
dança sua história
pra historiá a vida


Vira navega-dor
que usa o vento
o leme
e água
pra chegar em terra firme
e partir de coração partido a outro porto
porto do Outro
onde desejo sempre
o desejo outro... 

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

A-mar


Acordei pensando na gente...
Olhei pro lado e ao ligar o abajur
Vi uma frase a muito tempo escrita nele...
Drummond que me ensinou:
"Amar se aprende amando"
Pensei que talvez seja isso,
É um aprendizado
que só é possível fazendo...
Assim como tudo na vida.
Como posso amar sem invadir?
Sem exigir do outro algo que ele não tem?
Sem ao mesmo tempo abdicar de mim?
Não tenho respostas...
Só sei que viver é correr o risco
Risco de amar e ser amado
Risco de às vezes escorregar
sem aviso prévio de piso molhado
É risco de sorrir, chorar, cair e levantar...
Talvez a vida seja isso
Aprender comigo e com o outro...
Amar a mim e ao outro...
Aprendi com Clarice:
A vida é uma aprendizagem ou um livro de prazeres, 
tudo ao mesmo tempo... 
tudo no nosso tempo.

terça-feira, 5 de setembro de 2017

Riu-achado

Deságuo feito água
feito parede rachada do tempo...
cansada de ficar de pé
Deságuo feito riu a muito represado
Deságuo riacho, riu achado
e reacho o achado que a tanto perdido
Achei que já tinha ido
mas volta dando voltas
nesse espaço aberto do peito
feito sopro no coração
feito palavra dando vazão.

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Beijos e abraços tem/sem seu fim

Seria uma história possível?
Não sei
Mas foi 
nada? 
Não sei
Talvez um roteiro reinventado dentro de mim
Criado e recriado na minha cabeça 
Talvez
Não sei
Teria seu fim sem um começo?
Começo a pensar que sim
Que saco
Des-há-sossego sem fim. 

quarta-feira, 19 de julho de 2017

Des-pedida


Eu virei a cabeça pra ver você indo...
Queria ter essa imagem guardada na memória.
Não deu, você foi rápido demais.
Você foi e ainda continua aqui...
Tenho diálogos com você no decorrer dos dias.
Eu ainda te conto minhas novidades enquanto passo café. 
Mas, não tenho mais o cheiro do seu tabaco no meu apartamento.
Não tenho mais seu sorriso quando te contava algo bom.
E apenas imagino como as coisas estão por aí...
Meus dedos se lembram como era passar as mãos nos seus cabelos lisos cor de caramelo.
Minha boca se pega sozinha pensando na sua e como gostava quando elas se encontravam.
Meu peito aperta, mas não desaba. 
Ele prefere pensar que você apenas tirou férias de nós, mas que volta.
A cabeça lhe explica que não, e que é melhor assim, pois ela tem mais tempo pra ela. 
Mas, o peito teimoso que só, não acredita e se recusa a chorar...
As pernas, coitadas, ficam sem saber muito onde pisar. Se sentem bambas, e nostálgicas lembram de como era quando te viam passar.
Os braços parecem maiores e se colocam a ficar nos bolsos, que é pra não correr o risco de te procurar.
Os olhos já marejados se põem a descansar e, então, fechados te enxergam e fazem tudo parecer real. 
Falso eles são!
Mentem e na mentira revelam a verdade.
A verdade que custa e o preço é alto.
Ela que me afasta de ti 
e chega tão perto de mim.


quarta-feira, 12 de julho de 2017

Acontece às vezes

Sabe isso que acontece às vezes
Da gente gostar de alguém
Acorda sorrindo
E já no café senti saudade

Sabe isso que acontece às vezes
Da gente amar alguém
Acorda juntinho
E no café dividir a xícara

Sabe isso que acontece às vezes
Da gente ter que aguenta ver a pessoa ir embora
De não querer mais acorda junto com ninguém
E no café ter que volta por açúcar

Sabe isso que acontece às vezes
Que chama vida
Dialética interminável dos porcos espinhos
Que ou morrem de frio ou se se machucam

Sabe isso que acontece às vezes
Que deixa teu coração apertado
a cabeça dispersa, pernas cansadas
e os olhos marejados

Eu sei,
mas por vezes
e às vezes eu queria não ter que saber... 

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Vai tempo...

O tempo tem corrido na minha frente
Ele passa, acena e sorri
Quando vejo já estou ficando para trás...
Parece uma corrida que ele sempre ganha.
Eu aperto o passo, tomo fôlego
e quando acho que vou alcança-lo
ele dispara na minha frente de novo...

O tempo tem me feito de palhaça
Ele ri, dá uma bela gargalhada na minha cara
Estou sempre dizendo não ter tempo
e quando tenho acho que estou perdendo tempo

Uma vida em um minuto
Aquele do abrir e fechar os olhos
Do piscar, do olhar, do amar

O tempo tem me pregado peças
Tem me deixado sem tempo de ter um tempo
pra pensar no tempo que foi
que é
e que vai

Vai tempo...

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Aparecimento do poeta

Não é o poeta que cria a poesia
Mas, a poesia que finda o aparecimento do poeta
Ela não é representa-ação
Muita menos mera reprodução
Ela cria aquele que escreve, repete
De certa maneira o antecede
Como ausência que se presentifica
feito presente o aparecimento do poeta


terça-feira, 20 de junho de 2017

Escorri-mim

Nos últimos dias, escorri
Com a boca cheia de palavras
E o útero cheio de sangue
Me vi escorrer, perder, quebrar
Me vi em mil pedaços de mim,
Achei que fosse sumir, quis sumir
Desaparecer, não existir
Recebi um não, dois ou três
Fragmentei, estraçalhei, chorei
Escorri em lágrimas e em sangue
Senti dor, senti o vazio, o traço, o corte
Senti o não, a minha castração
Nos últimos dias, escorri
Escorri feito líquido sem forma, 
sem contorno, sem casa
Escorri pela vagina feito sangue
meu sangue


quinta-feira, 15 de junho de 2017

Sujeita

Ao olhar-te vejo a mim
reflexo dessa imagem que me escapa

Ao olhar-me vejo partes
desconhecidas conhecidas

Ao olhar sou olhada 
como inteira fragmentada 
sou dada, criada

Olhar que sustenta e divide
fazendo-me uma sujeita
um tanto assim barrada

quinta-feira, 8 de junho de 2017

Resto

vivemos do resto
do resto deixado por essa
operação quase matemática

o resto do corpo
o resto do beijo na memória
o resto da comida na geladeira
o resto de você que ficou em casa

hora outra acho restos
restos seus
uma meia, um casaco
um livro esquecido ou não
pode ter sido deixado

o resto não tem nome
não tem palavra
é o resto que sobe do bueiro
quando a rua alaga
o resto fecundo
que por ser resto
é apenas o que nos resta

sexta-feira, 2 de junho de 2017

Tudo de medo


medo de monstro
medo de escuro
medo do estranho
medo do ir
medo do vir
medo do novo
medo do velho
medo de mim
medo de você
medo de te querer
medo de não te querer mais
medo, medo, medo de tudo...
tenho medo
medo de tudo
medo até de não sentir mais medo
vou de um medo a outro, sentindo medo
vou e não fico
até que o medo vira 
só medo mesmo

terça-feira, 30 de maio de 2017

Bazar da culpa

Mais fácil seria eu te culpar
A culpa dar, te doar
Mas, ela não é sua
Não tem há ou a ver com você,
a compartilhar
Você ocupa meu imaginário,
minha ilusão de eu
Que ao sonhar, acorda e vê
estranha de si mesma
Estranha e sem você
Que aqui não está, nunca esteve
Aqui onde eu nunca quis que estivesse.

quarta-feira, 17 de maio de 2017

Presos


Presos estamos todos
uns mais e outros menos
Presos dentro de nós mesmos
Dentro do corpo, da alma e da mente
Presos de dentro para fora 
alguns de fora para dentro
Presos no contorno da pele 
no toque da mão

Presos estamos todos
no olhar direto e reto dos apaixonados
Presos somos todos
na liberdade de ser tudo e nada
nada e tudo
Porém, presos e tolos
são aqueles que querem presos os loucos. 


terça-feira, 16 de maio de 2017

Cuida

Planta, rega, cuida
ela, então, cresce.
Não pode dar água de mais
E nem dar água de menos.
Tem hora que gosta do sol
Tem hora que quer a sombra
A terra ela anseia
boa e adubada.
Sem a terra as raízes não firmam
e ela não cresce.
Sem ela, murcha
e as folhas ainda que resistam
caem uma a uma.
Até que dela só a terra resta
que sem ela
não resta terra alguma.

segunda-feira, 1 de maio de 2017

pequena que a-parece grande

- É terra ou é areia?
- sei lá, se não é tudo a mesma coisa...
- é tudo pequena, igual tu!
- é, pequena que de tanta parece grande.

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Tempo lógico


- O tempo..,
- Que tempo?
- O tempo, sabe?
- Que tempo? Eu não tenho tempo pra isso... fala logo que tempo!
- O tempo, aquele que é, mas agora era, ele é, mas agora já foi...
- Eu já falei que não tenho tempo pra isso. Tenho coisas, amanhã eu levanto cedo.
- É, esse que tem, mas agora já não tem, porque já foi. Ele é e ele foi, ele evanesce. É efêmero esse tempo.
- Efêmero? Ora, larga disso e vem me ajuda, o tempo passa e amanhã tenho coisas, coisas, coisas a fazer.
- Amanhã?
- É José, amanhã, amanhã depois de hoje.
- Não, não era esse que eu tava falando. Falei do tempo que a gente é. Mas, agora deixa. Já não é.
- Mas, e amanhã José, você vem?
- Não, vou fica mais um tanto, dando um tempo.
- A José, me dá um tempo você viu!

segunda-feira, 17 de abril de 2017

Avó


Sei menos da sua história do que gostaria
Mas sei que parte de mim já existia dentro dela 
quando em seus óvulos ela gerou minha mãe. 

Na verdade é ela que deu meu maior presente
a possibilidade de vida 
quando a vida ela deu a minha mãe. 
     
Ela é viva, sempre foi e sempre será
A vida está nela e ela soube amar
Com todos os seus erros que eu nunca consegui enxergar
a avó sempre jovem aqui comigo sempre estará. 

domingo, 16 de abril de 2017

Pés



Pés descalços sujos do barro
que da terra a vida empresta

Pés que plantados no chão
voam nas letras dos poemas
que das páginas a vista empresta

Pés que de vista lhe emprestam apenas o andar
mas que de vida prestam para a vida suportar. 


quarta-feira, 8 de março de 2017

A menina do sol

Tomar café e apreciar o sol da manhã era um dos seus maiores passatempos. Era neste momento em que ela refletia sobre seus amores e suas dores ou simplesmente não pensava em nada. Foi em uma destas manhãs, que tal menina percebe-se nem tão menina assim. Percebeu que suas dores eram mais profundas e que apenas refleti-las já não fazia tanto efeito. Constatou que seus amores não mais bastavam por si próprios e que a troca era agora uma necessidade. 
Pensamento que fez com que demorasse um pouco mais para começar o dia. Chegou atrasada no trabalho, não conseguiu terminar os afazeres acadêmicos para entregar na aula e de noite embebedou-se com os amigos. No bar, tentou explicar seu sofrimento, pois alguns haviam percebido. Porém, muitos não prestaram atenção e apenas lhe empurraram mais álcool. Um destes amigos, que havia enchido o seu copo e que com tal comportamento tinha lhe despertado uma grande raiva, virou-se para ela e disse: “Parabéns você tornou-se adulta”. A menina ou a moça, ainda não sabia dizer, respondeu-lhe enfaticamente que ele estava errado. Como ela haveria de ser adulta quando começará a praticar tudo errado. Não fazia mais os que outros desejavam, seguia seus desejos e vontades, permitia-lhe ser infeliz para logo tornar-se feliz, não suportava mais algumas pessoas e seus dramas cotidianos e desejava vorazmente a presença real de alguns. Era agora um ser horrível! 
Como faria para voltar a ser aquela menina amável e que só sabia fazer o bem. Que fazia tudo que os outros mandavam e era sempre agradável. Que adorava mostrar seu sofrimento, pois as pessoas se sentiam melhores. Como faria para esconder sua felicidade, a felicidade em saber que a tristeza existe e que o seu mundo era ilusório. 
Tal pensamento passava pela cabeça e não a deixava seguir. As horas do dia corriam e freavam, os sentimentos eram mistos e complexos, o corpo já não lhe acompanhava, tinha se recusado a viver assim.
Tomando os problemas em suas mãos a menina decide entregá-los àqueles adultos que saberiam o que fazer e o que dizer. A maioria disse-lhe a mesma coisa, que a menina devia mudar, estava errada e devia tomar cuidado, pois, do contrário se perderia no caminho.
Mais angustiada e sentindo-se traída, a menina vê-se em uma enrascada. Tinha confiado nestas pessoas e agora que ela havia chegado onde queria, onde a felicidade era possível e não uma ideia, eles a mandavam mudar. Mudar o que? Os erros já haviam sido cometidos e tinham a feito assim. Não queria mudar, já havia mudado. Não era mais menina, era agora ela. Já conseguia pronunciar o eu e o sou.  SOU MULHER, palavras que saem de sua boca uma hora ou outra na manhã de sol, no anoitecer e até na mesa do bar.

domingo, 12 de fevereiro de 2017

O que me leva até você?


Um dia desses me deparei com a pergunta: "O que me leva até você?" Um turbilhão iniciou dentro de mim, tentei ignorar, rolei a página para cima e para baixo, mas a pergunta não desgrudava da minha mente.
Parece que ela tinha vindo direto para mim, como um dedo que tira a casca do machucado ainda por cicatrizar e esse volta a sangrar. Pois bem, decidi escrever, afinal o que mais eu podia fazer.
Ao tentar pensar e escrever o motivo que me leva até você, surgem várias palavras bonitas, expressões de afeto e amor. Mas, sei que são apenas ilusões, são mentiras que conto todos os dias para mim mesma a fim de esconder o real motivo, aquele feio e até um pouco fedido que faz com que eu te procure.
Então, me arrisco a sentir um pouco esse cheiro, para que eu consiga ser honesta comigo mesma. Para quem saiba ele se transforme ou que eu simplesmente deixe de querer te procurar ou até mesmo para que eu toque o foda-se e te procure para sentir não só o cheiro, mas o gosto ruim em minha boca que esse encontro pode ou não causar.
Desculpe-me, mas sei que o que me leva a você, na verdade tem pouco a ver com você. Não é seu jeito maroto de andar, o seu sorriso que me faz rir e nem mesmo por me fazer gozar. É na verdade, esse meu medo de me olhar no espelho e me ver só, essa aflição que tenho de sentir apenas o meu cheiro no lençol, isso de ter que conviver comigo mesma, de não ter alguém para no meu lugar lutar. Por tanto tempo eu fui ensinada que precisava de você. Foi me dito que sou frágil, que sozinha eu não conseguiria e que você seria meu herói, meu salvador, aquele que me tiraria da dor. 
Fedida inocência. Você não é nada disso. O meu salvador é na verdade ela, ela que está em mim. Você pode ser apenas uma companhia boa ou desagradável, se assim eu desejar. Claro, se você também quiser. Mas meu bem, não fique com medo ou se vanglorie. Pois disso você não vai passar...